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Revista do Farmacêutico

PUBLICAÇÃO DO CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Nº 120 - FEV-MAR / 2015

 

O desafio das superbactérias

Autor de pesquisa sobre uso racional de antibióticos, farmacêutico clínico dos Estados Unidos fala sobre o desafio de controlar as superbactérias no mundo

Douglas Slain, da Universidade de West Virgínia (Divulgação)O uso indiscriminado e até irresponsável dos antibióticos, durante décadas, potencializou a resistência bacteriana em todo o mundo. No Brasil, profissionais de saúde têm buscado aprender com a experiência dos países desenvolvidos para enfrentar o problema.

Em janeiro, o XV Encontro Paulista de Farmacêuticos contou com a participação do especialista norte-americano Douglas Slain, da Universidade de West Virgínia, responsável por uma pesquisa sobre o uso racional de antibióticos no hospital da instituição.

Na entrevista concedida à Revista do Farmacêutico, o pesquisador discorre sobre a importância do profissional nos programas de combate ao uso indevido desses medicamentos, adotados em seu país. Segundo ele, farmacêuticos são reconhecidos em suas comunidades, nos Estados Unidos, e, principalmente, por todos do setor da saúde envolvidos com a causa e com o desenvolvimento de novos medicamentos. Leia, a seguir, trechos da entrevista:

Por Carlos Nascimento

Revista do Farmacêutico – Qual é a importância do farmacêutico para combater a resistência bacteriana? Como esse trabalho é realizado nos EUA?

Douglas Slain – Os farmacêuticos são muito importantes nos hospitais americanos, pela participação em programas de gestão responsável de antibióticos. Lá, os farmacêuticos comunitários oferecem educação e algumas farmácias realizam testes rápidos para certas infecções, que podem ajudar a limitar o uso indiscriminado de antibióticos. Farmacêuticos têm participação ativa como membros da Sociedade Americana de Doenças Infecciosas (IDSA), na orientação da administração de antibióticos, especialmente aqueles com formação especializada em doenças infecciosas. Nas farmácias comunitárias, os farmacêuticos estão estudando o uso de testes rápidos de gripe como uma forma de diminuir o uso inapropriado de antibiótico. Esses métodos são apoiados pela Sociedade Farmacêutica de Doenças Infecciosas (SIDP).

RF – O que a indústria farmacêutica e a profissão médica podem fazer para diminuir as taxas de resistência bacteriana?

DS – As empresas farmacêuticas estão mais envolvidas com pesquisas em farmacodinâmica do que no passado. Os médicos também estão mais preocupados com o uso racional de antibióticos. Médicos especializados em doenças infecciosas são uma das profissões mais importantes para o uso racional de antibióticos, de acordo com as diretrizes da Sociedade Americana de Doenças Infecciosas.

Douglas Slain, da Universidade de West Virgínia (foto: Luiz Prado / Agência Luz)RF – Como dimensionar o problema da resistência bacteriana no mundo?

DS – A resistência bacteriana é comum em todo o mundo. Estamos percebendo que há bactérias que estão nos deixando sem medicamentos seguros. Por exemplo, estive na Índia há um ano e meio e muitos pacientes foram infectados com a bactéria NDM (New Delhi Metallobetalactamase). Eles tinham um antibiótico que podia funcionar com algumas infecções. Mas outras infecções não tiveram nenhum antibiótico viável.

RF – Existem perspectivas de desenvolvimento de antibióticos novos ou outras formas de tratamento? Há pesquisas importantes sendo desenvolvidas nos Estados Unidos?

DS – Sim, há empresas farmacêuticas como a Cubist Pharmaceuticals e a Forest Laboratories, dentre outras, que estão desenvolvendo novos antibióticos. Durante anos, houve uma queda drástica no desenvolvimento de antibióticos. Agora as opções estão se ampliando.

Vejam artigo no portal PEW Charitble Trust¹, que faz uma análise dos antibióticos atualmente em desenvolvimento clínico. Precisamos de medicamentos que possam tratar as bactérias ESBL (Espectro estendido beta-lactamase, em português) e KPC (Klebsiella pneumoniae carbapenemase)

RF – A legislação brasileira só recentemente restringiu a venda de antibióticos. Durante os últimos 70 anos, as pessoas compravam antibióticos sem receita nas farmácias. É possível prever as consequências desse uso excessivo?

DS – É difícil dizer exatamente, mas, provavelmente, levou à resistência. Uma das razões que provavelmente levou ao desenvolvimento da bactéria NDM na Índia foi o excesso dos antibióticos. Isso foi discutido em um estudo realizado por Thomas Van Boeckel no periódico The Lancet Infectious Diseases², que analisou o consumo global de antibióticos no período de 2000 a 2010.

¹ Artigo pode ser acessado no site www.pewtrusts.org/en/multimedia/data-visualizations/2014/antibiotics-currently-in-clinical-development. Segundo este artigo, em setembro de 2014, um número estimado de 38 novos antibióticos com potencial para tratar infecções bacterianas graves estão em desenvolvimento clínico nos Estados Unidos. Mas o sucesso desse desenvolvimento é baixo. Na melhor das hipóteses, apenas um a cada cinco candidatos que entram em testes para humanos são aprovados para pacientes.
² Segundo Thomas Van Boeckel, o aumento do consumo de antibióticos tem causado preocupação para a saúde pública. O uso adequado de antibióticos em países em desenvolvimento deve ser incentivado. No entanto, para evitar um aumento na resistência em países de baixa e de média renda com grandes populações e para preservar a eficácia do antibiótico em todo o mundo, os programas que promovem o uso racional através de esforços coordenados pela comunidade internacional devem ser uma prioridade.

 

 

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